Caro leitor, fomos enganados! Que bom é ser enganado desta forma! Desde erros superiores à vontade humana, passando pelas mudanças repentinas e inesperadas do marcador, até às ilusões apenas ao alcance dos melhores fantasistas, a primeira mão do Real Madrid-Manchester City (3-3) esteve cheia de equívocos, fingimentos e embustes. E que boa foi!
François Letexier, qual maestro, apitou para dar início a 15 minutos eletrizantes, de puro rock&roll, dos mais frenéticos desta edição da Liga dos Campeões.
Depois de inaugurado, o marcador em português continuou. A guitarra portuguesa deu lugar ao samba, bem mais animador para os adeptos madrilenos. Vinícius Júnior e Rodrygo foram essenciais: trouxeram o futebol de rua para as quatro linhas e desafinaram a estratégia cityzen. Na grande jogada do primeiro tempo, Vini lançou Rodrygo, que, rápido, fugiu à defesa inglesa e enganou Ortega, que já havia caído em erro quando um desvio colocou a bola de Camavinga no fundo das redes. Dois golos para os da casa e o marcador cheio de vida.
Até ao descanso, a primeira parte escreveu-se de forma bastante simples: impotente, o Manchester City não conseguiu criar grande perigo; atrevido e pragmático, o Real sambou e não andou longe do terceiro.
Energias repostas e estratégias redefinidas. O Manchester City até entrou pior, mas não demorou muito a recuperar a batuta. Bernardo, Kovacic e Grealish foram dos melhores, face ao surpreendente desaparecimento de Haaland e Foden. Foden? Sim, até ao minuto 66. Aí, o fantasista inglês deixou cair o pano da invisibilidade e, com a canhota mágica, chutou ao ângulo, sem qualquer hipótese de defesa.
O placar, pobre coitado, não teve descanso e prever o seu desfecho tornou-se impossível. Minutos mais tarde, o primeiro toque trapalhão mascarou bem o segundo: Gvardiol encheu o pé e obrigou o marcador a nova cambalhota.
Sem descanso, o rodízio de golaços não acalmou e Valverde, esperto, também se serviu. Vini cruzou pela esquerda e, de primeira, sem deixar cair, o uruguaio apareceu no lado oposto a encher o pé e a fuzilar para novo empate.
O ritmo baixou ligeiramente após o sexto (!) golo, mas não tornou o jogo menos fantástico. Foi um daqueles que ninguém deseja o apito final, mas, inevitavelmente, surgiu. Nem o recurso aos bancos desequilibrou a balança e, por isso, seguiu tudo em aberto para a segunda mão, em Inglaterra.
Bernardo, Foden, Vinícius e Rodrygo. Fantásticos. Além da inerente e assinalável qualidade técnica, ímpar no mundo do futebol, os quatro conseguem ser decisivos, marcar (golaços, ainda por cima) nos grandes palcos. São extraordinários, geniais. Agradecem os adeptos e, sobretudo, os treinadores, certamente.
Rudiger rubricou uma exibição muito competente, do início ao fim do jogo. Conseguiu secar Erling Haaland, que passou completamente ao lado do jogo. Só se notou quando baixou no terreno e somou dois desarmes, de resto, passou despercebido.
Exibição muito positiva do árbitro. A ausência de lances polémicos, como é lógico, ajudou. Ainda assim, o juiz do encontro soube manter um critério justo, deixou jogar e não visou ser o protagonista. Como foi visível, ganhou o espetáculo.