Da penúria ao fausto, da fome à barrigada de golos. O futebol pode ser um lugar estranho para alguns, mas é provável que a lógica impere quando as opções são as melhores. O acerto de Sérgio Conceição, feito na transição de ano civil, encaixou as peças e alinhou os astros.
No 1-3 azul e branco, o melhor foi Evanilson. O atacante já toca a elite mundial, fez mais dois golos e pede a atenção de Dorival Júnior, novel selecionador brasileiro. Um triunfo duro, embora lógico; selvagem, embora artístico.
A pressão passa para a Reboleira (onde joga o Benfica) e Alvalade (Sporting-Casa Pia).
Nem o melhor dos cronistas, que estará bem longe destas letras, será capaz de ter todas as explicações. Há umas semanas, um jogo desta natureza teria custado dois ou mais pontos ao FC Porto.
O remate de Elves Baldé à barra (minuto 18 - veja aqui o LIVE) e o penálti atirado pelo delicado pé esquerdo de Mattheus Oliveira para a bancada (minuto 33) provavelmente teriam acabado na baliza de Diogo Costa. O lado emocional, energético, talvez tenha alguma coisa a ver com isto, mas o estratégico é que é decisivo.
Certo é que em dez minutos tudo caiu para o lado azul e branco. Em cima da meia-hora, os dragões tiveram um penálti a seu favor revertido (bem) pelo VAR, viram a relva a prejudicar Mattheus no outro penálti e fizeram dois golos logo a seguir: primeiro num remate rasteiro de Evanilson (as diagonais do brasileiro são mortais) e depois num pontapé de Alan Varela, muito menos tímido, num canto bem trabalhado.
Nesses dez minutos alucinantes, e que confirmam o futebol como o mais belo dos jogos, o FC Porto passou de um plano de medo para um de domínio.
Diogo Costa a acalmar atrás, Pepe e Fábio Cardoso mais cúmplices do que nunca, João Mário e Wendell a passarem de problemas a soluções. E, à frente deles, Varela-Nico, uma dupla que assegura um controlo com bola (mais de 70 por cento de posse) nunca antes visto.
E, depois, três aceleras no apoio a Evanilson. Simples e eficaz.
O jogo pareceu resolvido, tal a superioridade do FC Porto em largos períodos, mas um erro individual de Alan Varela (penálti sobre Mattheus) atirou Bruno Duarte para a marca de castigo máximo e o Farense reergueu as interrogações.
Depois, houve Eva e o pecado não original dos algarvios. Expuseram-se nas precipitações a sair para o ataque e o FC Porto respondeu com um passe de Pepê a servir o bis de Evanilson.
O FC Porto sossegou apenas aos 76 minutos, mas deixou em desassossego os rivais diretos. Também não está mal.
Há dois momentos quase decisivos na partida: o penálti falhado por Mattheus Oliveira (antes do FC Porto fazer dois golos) e o terceiro golo dos dragões, numa fase em que o Farense ameaçava agarrar qualquer coisa no jogo. A chave acaba por ser a coerência do FC Porto ao longo do jogo, muito confortável no combate e na arte.
Noite agitada, mas positiva, para João Pinheiro. Foquemo-nos nos lances-chave: o VAR reverteu bem um penálti assinalado por Pinheiro em falta (inexistente) de Elves Baldé sobre Galeno, mas não teve o mesmo apoio no penálti assinalado a Fábio Cardoso - o lance é muito duvidoso, a bola bate na axila e vai ao braço, que estava aberto. Análise complexa. Em relação ao penálti de Varela sobre Mattheus Oliveira, nada a apontar: tudo certo.
Libertado pelas malditas lesões, Evanilson recuperou os golos e a confiança. A qualidade esteve sempre lá, mas agora joga sem algemas e com um ar de felicidade. Os dois golos em Faro confirmam o estado de graça: são sete nos últimos quatro jogos oficiais. À atenção do senhor Dorival Júnior.
Sim, Mattheus Oliveira falhou um penálti, mas depois disso o Farense teve tempo para corrigir o lapso e não o fez. Sobretudo pela incapacidade de Falcão e Cáseres em protegerem a ligação Pepê-Evanilson. Pouco influentes, limitados com bola e infelizes sem ela, apesar do esforço exemplar.