A Europa do futebol traiu o FC Porto. Amante de tantas noites, confidente em tantas aventuras, esta velha conhecida virou as costas aos dragões e empurrou-os da Champions. Uma crueldade para quem tanto deu ao jogo.
Minuto 90+5: Mehdi Taremi atira para golo e Dumfries, quase em cima da linha, salva o Inter.
Minuto 90+6, take 1: Taremi, outra vez, dispara ao poste da baliza de Onana.
Minuto 90+6, take 2: na insistência, Marko Grujic cabeceia à barra.
O Dragão leva as mãos à cabeça, olha o céu e recorda as glórias idas, os golos beijados, os oponentes vergados. Oponentes bem mais fortes e competentes do que este Inter, um fiel depositário do adjetivo mais aplicado às equipas italianas dos anos 80 e 90: cínico. Cínico e inofensivo, apesar de tantos milhões e tantas estrelas.
Os nerazzurri seguem em frente, sem saberem bem como. Não terão, certamente, vida longa na prova, mas saíram da Invicta a festejar.
O que faltou ao FC Porto para ferir o Inter? Há uma conjugação importante de fatores, bons argumentos para tentar explicar a eliminação.
Além de atravessar o pior momento da época - dizem-no as más exibições contra Rio Ave e Estoril, além da derrota sui generis perante o Gil -, o campeão nacional sentiu a ausência dos dois maiores animais competitivos do plantel (Otávio e Pepe, este uma surpresa desagradável de última hora) e teve outras peças fundamentais a render aquém do esperado.
Pepê resolveu a baixa de João Mário a lateral, mas criou um problema de défice de criatividade e arrojo na frente; Uribe, um dos mais experientes, falhou passes atrás de passes; Zaidu foi o lateral desconcentrado e trapalhão que tem sido, incapaz de conjugar em simultâneo a velocidade e a capacidade de decisão.
E assim, apesar de tantos ses, o FC Porto foi muito superior a este desencantado Inter e só o FC Porto quis e podia ter ganhado o jogo.
Não surgiu o sagrado golo, faltou uma combustão mais firme, quiçá.
A estatística ajuda a entender o jogo, mas por uma vez a lógica não abraça os números. Tantos remates (21 contra 12) e tanta posse de bola (62 para 38 por cento) não fizeram uma conta de somar.
A equipa de Conceição passou de controladora a dominadora e de dominadora a ameaçadora - talvez demasiado tarde, neste derradeiro capítulo interpretativo.
Não foi suficiente, apesar da crença das 46 mil almas portistas até ao apito final. O clímax prometeu o nirvana, a reconciliação com a tal amante tantas vezes perfeita, mas o paraíso prometido não passou de um logro.
Consequências imediatas? A pancada emocional foi forte e há uma visita a Braga dentro de dias.
Se o FC Porto for capaz de se recompor a tempo, o campeonato continuará vivo. A Europa é implacável para quem se atrasa a ser feliz.
Até ao apito final, a turba azul e branca acreditou no golo. Com toda a lógica, tal a coragem e o risco assumidos no assalto à baliza de Onana. De nada valeu, é verdade, umas vezes por precipitação, outras por mero acaso. O futebol, principalmente na UEFA, não perdoa os clementes.
Tantos milhões e tão pouco futebol. Lautaro, Barella, Dzeko, Lukaku, Dumfries, todos internacionais e todos caríssimos. Juntos, neste Inter, não fazem uma grande equipa. Muito defensiva, a especular com o jogo, a sofrer e a jogar poucochinho. O treinador Simone Inzaghi tem matéria prima para muito mais.